quarta-feira, 27 de outubro de 2010

UMA MOÇA CHAMADA AMOR

O amor levanta muito cedo todos os dias. Aos sábados e domingos um luxo a mais: levanta cedo, apenas. Cinco filhos pariram esse nosso amor que vos falo. Cinco filhos em ordem cronológica. Intervalo? Nove meses, no máximo. Amor ingênuo esse, não sabia antes como nasciam as crianças, amor idiota que até então só tem a certeza de uma certeza; a da não certeza, amor imbecil deixava-se apanhar no rosto, desapercebia-se por dias do pau no ânus que enfiavam nos seus filhos seus próprios filhos, amor destinado a nascer em uma casa sem cal nem tinta sem H20 sem carboidrato sem potássio sem amido sem glicose sem. Com?! Apenas uma; a verdade nua e crua, em sobra.

Mas todo amor há de ser otimista, o nosso, então, por que não?! Amor otimista transforma o buraco no telhado motivo para ver as estrelas, amor sorridente procura nas esquinas recompensas para sofrimentos. Amor ciclo! Quadriciclo, em movimento? Amor corte, no olho, e beijo, no corte. Amor esperança transforma bicicleta em meio de transporte, trabalho em viagem, amor obediente limpa merda dos outros, sente o cheiro de merda dos outros, aquele odor de lugarejo mal varrido, de fossa exposta. O amor que vos falo não consegue terminar um parágrafo otimista, pois nos entristeça, então, então, amor ouvinte de asneiras de constestações de contemplações alheias e cala-se, cala-se, amor gritado inúmeras vezes e inúmeras permanece mudo, estático, aterrorizado, medo sabe-se lá de quê.

Amor que levanta cedo todos os dias, bebe um ônibus, toma um café, encontra outros amores, outras tantas fossas expostas, amor que chora e sorri, amor que volta pra casa, treme quando assaltado, amor que se mas-tur-ba escondido, amor. amor que ama a sua rua mal iluminada, amor que se esconde-difícil-acesso, amor que reconhece seus filhos pelas sombras sentados na calçada da rua mal iluminada. O amor pára, pára e sente seu próprio gosto, morde sua própria alma, deglute seu próprio ego sem dar-se ao menos conta. O amor que vos falo pára, pára e dorme: deita com fome, acorda com sede.

O Amor que não é nada disso, o Amor que, sim, supera tudo isso!