quinta-feira, 30 de junho de 2011

DIA-A-DIA DE UM MOTORISTA NATALENSE

06h da manhã. Você acorda 1h antes porque mora meio longe do centro da cidade, sabe como é, coisa chata é morar perto de onde se trabalha [aluguel por lá é mais barato, óbvio]. Liga seu carro [usado, divido em 20x sem juros e sem entrada] e antes de sair da garagem olha para ambos os lados [vai que vem algum moleque por aí, essa onda de assalto]  à procura de conferir a neblina matinal  e a doce paisagem da sua amada cidade [sacolas de plástico pelas ruas por causa da chuva de ontem].
12h você vai almoçar e logo no primeiro semáforo você se dá conta do quão solidárias as pessoas podem ser. Alguns se oferecem para limpar o vidro do seu carro [emprego informal sem direitos empregatícios assegurados], outros te entregam panfletos com lindas mensagens [supermercados, novos condomínios e como ter de volta o seu amor em dez dias] e os últimos te oferecem brindes [brindes comprados que você pode adquirir pela bagatela de 10 reais]. Apesar de não pode aceitar a oferta deles, você sorri e agradece [pois alguns não gostam de ser contrariados].
12h15m você pára em outro sinal [ofuscado pelos raios solares e sem abas de proteção solar] e resolve abrir os vidros para sentir a brisa lá fora [tanque na reserva, economizar gasolina que o cartel de R$2,65 da gasolina não tá dando]. Quando, de repente, um camarada [nada amigável] passa ao seu lado e você resolve subir os vidros novamente e ligar o ventilador do carro já que você não estava com calor mesmo. Próximo retorno à esquerda [ah, não! Estou na Antônio Basílio e fecharam os retornos recentemente], andarei mais um pouco [uns 5km] mas entendo que é pro bem do tráfego e tenho certeza: os retornos agora implantados foram duramente estudados [aham!]. 
12h30m você sai da BR no sentido Av. da Integração e se surpreende com uma linda lagoa surgida de repente na estrada como um oásis [representante ferrenho de um dos 108 pontos de alagamento da nossa cidade], você resolve [já que não tem outra opção] entrar numa rua de barro para fazer rally já que sempre foi seu sonho [e não haveria hora melhor para isso do que quando estivesse voltando do trabalho para almoçar em sua casa]. 
12h35m voltando da rua de barro [você bate em um paralelepípedo jogado no meio da rua], em direção a sua casa, você se surpreende novamente com um lindo barulho [você acaba de perder um pneu porque caiu em um mimi´s buraco, e não mini buraco]. Você desce do carro e sorri pois foi somente um pneu que curiosamente se rasgou, e, fica feliz ao perceber o quão generosas as pessoas podem, olha só, estão todos sorrindo de volta [e pensando em que escala de 0 a 10 somos idiotas ao ponto de ainda pagarmos IPVA].
12h40m às 13h você se encontra fazendo musculação [com farda do trabalho, trocando o pneu do carro]. 13h você decide não almoçar [já que não tem outra opção] e voltar para o trabalho no seu carro [usado que divide as ruas com pedestres e ciclistas, já que não existem calçadas apropriadas ou ciclovias] agora com um novo pneu. 14h20m você chega no trabalho [atrasado porque o expediente começa às 14h] e é chamado pelo seu chefe na sala particular [para levar uma bronca daquelas]. 
No final do dia, embora esse tenha sido um pouco [completamente] hard. Você está feliz [sujo, cansado e fedido] porque, apesar de tudo, você é pai, homem e tem Deus no coração. E tem também um filho engajado [que entende a situação de todos nós e se revolta], inteligente [que utiliza dos seus meios, atualmente virtuais], solidário, [que utiliza seu tempo para pensar no conjunto], e, reconhecido [por horas como apenas um fake da internet]. 
Mas tá tudo muito bem por aqui, viu? Afinal, seis favelas já foram erradicadas, 98% dos usuários das UPAS estão satisfeitos com o serviço da saúde, e, quanto ao Zoológico de Natal?  Ah, esse anda de vento em popa [a principal atração por lá é um animal peçonhento conhecido como borboleta].

3 comentários:

Acsa Brito disse...

Muito bom, Jéssica! Realidade com toques de ironia. Gostei mesmo! Parabéns!

Fábio disse...

Não existe retorno "a direita", a não ser que você esteja narrando algum fato acontecido na Inglaterra.

Jéssica Guerra disse...

Obrigada, Fábio, meu editor de texto! :D O trecho já encontra-se corrigido =]